Repensar a nacionalidade

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras

 

Nacionalidade é um valor insculpido na consciência coletiva. Indica a filiação individual a uma nação. A ideia de nação é emotiva e perigosa. Ernest Renan a conceituou com rara propriedade: os ossos dos antepassados, a história e a tradição comuns. A contemplação dos futuros, daqueles que ainda hão de nascer. A vontade de permanecer juntos e de partilhar o mesmo acervo memorial afetivo.

Só que o planeta encolheu. Corre os mesmos ricos, seja qual for o canto ou latitude. Em nome de nacionalidades, expulsa-se o morador de um espaço físico, tornando-o nômade. O drama dos refugiados.

Há nacionalidades de adoção. Aqueles que deixam o torrão natal e se estabelecem, com ânimo definitivo, em outra pátria. Merecem acolhida e identidade de tratamento. Principalmente em Repúblicas que elegeram o princípio da dignidade humana como norteador de tudo o que se possa fazer dentro de seu território.

O Brasil já foi mais generoso para com o estrangeiro. José Maria Lisboa, por exemplo, português de nascimento, prestou serviços políticos à República. Participou da primeira Constituinte e da primeira Legislatura. Jamais amealhou um centavo do subsídio que distribuiu a instituições de caridade. Na mesma ocasião foram deputados o alemão Alberto Kuhlmann e o italiano Miguel Arcanjo Camarano. Foram substituídos, na 2ª legislatura, pelos estrangeiros Carlos Jerke, Samuel Malfati e Samuel Saul. Permitia-se, então, ao peregrino de morada no Brasil, em 15 de novembro de 1889, sem protesto de nacionalidade, o direito de assento no Congresso Paulista. O objetivo era dar maior eficiência à grande naturalização trazida pela República. Depois disso, embora a lei fundamental paulista autorizasse a eleição de estrangeiros naturalizados, houve um só no congresso: o deputado José Pereira de Matos, natural de Trás-os-Montes.

Será que a exacerbação do conceito e do alcance de nacionalidade seja algo a prevalecer no mundo em que as fronteiras, meras convenções humanas, não se fazem respeitar por tudo o que é ruim? Chuva ácida, ilhas de pet a boiar pelos mares, exportação ilícita de armas, de drogas e até de humanos a serviço da delinquência?

 

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