Desproporção emblemática

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras

 

No deserto de boas notícias seria motivo de regozijo saber que o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social reservou um bilhão de reais para a restauração da Floresta Amazônica.

O maior tesouro brasileiro em biodiversidade está lá. E a ignorância, de braços dados com a ganância, tem exterminado a cobertura vegetal de que depende o futuro do Brasil e da humanidade. Muito já se escreveu sobre os “rios voadores”, sobre o “pulmão do mundo”, sobre o patrimônio incalculável que a preservação poderia gerar para o Brasil. Medicamentos, indústria cosmética, alimentícia, turismo numa era em que todos os lugares estão superlotados de viajantes, tudo isso representa uma fonte inesgotável de recursos para o nosso país. Sem falar no investimento internacional dos que precisam compensar o excesso de emissão dos gases produtores do efeito estufa.

Tudo muito bem e congratule-se com a iniciativa: restaurar seis milhões de hectares da região mais desmatada até 2030, daqui a seis anos, portanto. Isso equivale a seis milhões de campos de futebol. Os recursos serão destinados ao Fundo Amazônia, a unidades de conservação, terras indígenas, assentamentos e pequenas propriedades rurais. Outra parte dos recursos é reservado a linhas de crédito a produtores rurais de médio e grande porte, via Fundo Clima.

Só que é preciso indagar: um bilhão de reais é suficiente para a restauração do que tem sido degradado até com incentivo do Estado, a quem incumbe proteger o meio ambiente?

Esse Estado que não consegue eliminar a fome de seus filhos, dar a eles saneamento básico, educação de qualidade, moradia e trabalho, mas tem dinheiro para inflar os famigerados Fundos Eleitoral e Partidário. Reservar para eleições um dinheiro que não resolveria, mas mitigaria as máculas eternas de um país que envelheceu antes de ficar rico. Um país que perdeu suas melhores oportunidades. Tudo por causa da política, aqui transformada em profissão lucrativa, que nada tem a ver com o interesse público.

Louve-se o BNDES, mas não se perca a indignação para cobrar do governo o fim dos gastos desnecessários, os orçamentos secretos, as emendas destinadas a currais eleitorais, a propaganda desnecessária. Enquanto houver brasileiro com fome, não se justifica destinar dinheiro do povo, sofrido e exaurido em sua capacidade contributiva, para alimentar a volúpia dos que só pensam em si mesmos.

 

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