Avanço e retrocesso no projeto de reforma tributária

A discussão da reforma tributária voltou no início deste ano tendo como referência o projeto que o deputado Luiz Carlos Hauly apresentou na comissão criada para discutir o assunto.
Era uma proposta prévia que podia não ser a ideal, mas tinha como ponto positivo a criação de um Imposto sobre Movimentação Financeira (IMF), chamado de CMF, para substituir parte do INSS cobrado sobre a folha de pagamento das empresas.
Infelizmente o deputado Hauly acabou cedendo à pressão de adversários dessa forma de tributação inovadora, que tem como um dos grandes méritos a capacidade de combater a bilionária sonegação de impostos. Uma pena! A CMF seria um avanço.
A CMF seria bem-vinda porque poderia ser usada mais à frente para uma reforma tributária que efetivamente atende as necessidades do país.
O tributo serviria como um ponto de partida para ir absorvendo impostos e contribuições como previsto na engavetada PEC 474/01, que cria o Imposto Único.
Porém, seus críticos, os adeptos do burocrático Imposto sobre Valor Agregado (IVA), atuaram no sentido de eliminá-la do relatório dizendo que se trata de um tributo cumulativo e que a proposta não vingaria porque a população não aceita um tributo com as características da extinta CPMF.
Primeiramente cabe lembrar que a CPMF foi criada como um tributo a mais e a visão que a população tem dela hoje decorre de uma forte campanha de natureza essencialmente política contra sua prorrogação em 2007.
Muitas pessoas acreditaram na ocasião que ela era a fonte de todos os males da economia brasileira, mesmo a experiência tendo mostrado que esse tributo era eficiente e de baixo custo para o poder público e um excelente instrumento de combate à sonegação.
Hoje é compreensível a aversão da sociedade não só em relação à CPMF, mas a qualquer novo tributo que aumente a já excessiva carga tributária no país.
Porém, uma pesquisa realizada em 2007 pela empresa de opinião pública Cepac revelou que 64% das pessoas gostariam de uma CPMF no lugar do INSS sobre a folha de pagamento das empresas e 68% da população desejavam um imposto único sobre a movimentação financeira, um IMF, para substituir tributos como o Imposto de Renda, o ICMS, a Co-fins, entre outros. Ou seja, o brasileiro é contra a CPMF pura e simplesmente, mas apoia esse tipo de tributo como substituto dos atuais.
Em relação à cumulati-vidade cabe enfatizar que essa característica não tem o impacto alarmante que tanto se propaga.
O que determina a carga de impostos de um tributo cumulativo é a relação entre insumos e valor agregado em cada estágio do processo produtivo. Se uma empresa compra insumos e agrega valor ao seu produto a cumulatividade carregada das etapas anteriores de produção acha-se embutida no valor dos insumos adquiridos.
O valor agregado na nova etapa de transformação de um bem não sofre qualquer efeito cumulativo nessa mesma fase, passando a fazê-lo apenas na medida em que a produção se transforma em insumo em uma etapa posterior.
Cabe ressaltar que o peso de um tributo cumulativo no preço final de um produto é relativamente baixo.
Por exemplo, um setor que agrega 100% do valor dos insumos pagando 2% de IMF produz uma mercadoria com apenas 3,86% de tributo, muito menos do que ocorre com um IVA.
O IMF único é um bom imposto. Poucos técnicos se dão ao trabalho de analisá-lo de forma criteriosa e sem preconceito. Para os sonegadores é bom que continue assim.

Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular da Fundação Getulio Vargas. É autor do projeto do Imposto Único. É presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos).
www.facebook.com/marcoscintraalbuquerque

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