Crise dos 30 e a pressão pela busca de estabilidade e sucesso

A entrada para a vida adulta é marcada por diversos rituais de passagens, como o voto obrigatório ou a primeira habilitação. Na prática, a pressão pela conquista da tão sonhada estabilidade e sucesso aos 30 anos, idade eleita como um período de crise entre os jovens, tem se tornado sinônimo de frustação e ansiedade.

De acordo com a psicóloga Thamires Costa, a crise dos 30 anos é um tema recorrente em sua clínica. “Ao longo da minha atuação, recebi inúmeros pacientes com essa mesma queixa, inundados por uma angústia devastadora. Já trabalhei com adolescentes sofrendo com crises de ansiedade em relação ao vestibular e adultos sofrendo com as mesmas crises durante e após a faculdade, com esgotamento profissional no mercado de trabalho. É desafiador dar continência para essas demandas, pois esses pacientes chegam à clínica pressionados, tudo é urgente”.

Segundo a profissional, para quem ainda não se tornou alguém, o tempo é um fator angustiante e a passagem dele, se torna uma grande inimiga. “Por essa razão, a chegada dos 30 anos gera tanta angústia – a cada ano em que eu não conquisto os marcos sociais de sucesso, é um peso a mais para o histórico de fracasso, que só se confirma de forma muitíssimo dolorosa. Esse “ser alguém” é tanto algo que se busca desesperadamente obter, quanto uma figura persecutória que aponta o fracasso, aquilo que ainda não se é ou não se deu conta de ser”, explica.

A especialista cita, como exemplo, o autor Byung-Chul Han, que faz uma análise sobre os tempos atuais, em seu livro “Sociedade do Cansaço”. Na obra, ele ilustra que vivemos em uma “sociedade do desempenho”, onde seus habitantes são “sujeitos do desempenho”. Segundo o autor, o que impera no inconsciente coletivo é a necessidade de maximizar a produção e a pressão do desempenho.

“É um modelo social dominado pelo “positivismo”, de slogans do tipo “yes, we can”/ “sim, nós podemos”. Esse positivismo em excesso, onde tudo é maximizado, e não há parada ou espaço para o negativo, gera indivíduos depressivos e fracassados. Nessa lógica, você pode ter tudo o que você quiser, o céu é o limite, mas depende de você. Você é o responsável pelo próprio sucesso. Parece lindo, traz uma esperança maravilhosa, mas e se você não consegue?”, indaga a psicóloga.

A negação, impede que a pessoa entre em contato com seus conflitos e dores internas, ou seja, com o seu “negativo” como diz Byung-Chul Han.  É o típico caso de pessoas em um sofrimento imenso, mas que dizem “eu não posso falar do meu sofrimento, porque não posso reclamar, não quero parecer vítima, ou parecer fraco por isso. “Como quando o paciente chega à clínica e encara os conflitos que descobre sobre si mesmo, não como uma descoberta que produz alívio, mas como um problema a mais para resolver, a fim de alcançar um estado ilusório de cura, de normalidade”, diz a especialista.

A psicóloga destaca uma das frases mais impactantes do livro sobre o tema – “Nessa sociedade coercitiva, cada um carrega consigo seu campo de trabalho. A especificidade desse campo de trabalho é que somos ao mesmo tempo prisioneiro e vigia, vítima e agressor. Assim, acabamos explorando a nós mesmos”.

Mas o que fazer para combater essa crise? Para a psicóloga, quando falamos da crise dos 30 anos, vemos um indivíduo que busca estar adaptado ao mundo, mas distante de si mesmo.

“É interessante notar que ao chegar à vida adulta a preocupação seja o sucesso e não a descoberta de si: O que eu gosto? Quais experiências quero ter? Da onde eu vim e por onde será possível ir? Percebem a diferença? Essas perguntas nos tiram da exigência externa, e nos coloca em primeira pessoa, como protagonistas da própria existência. Como se parássemos de tentar enfeitar a fachada de uma casa para impressionar o vizinho, e pudéssemos de fato, construir uma morada confortável dentro dela”.

A maturidade humana não é uma questão de passagem de tempo e não depende de títulos ou de status. “Maturidade é uma conquista, possuí-la significa ter um lugar dentro de si que não pode ser comprado e que não depende de diploma para entrar, o tempo não demarca o fracasso, o tempo é fator de oportunidade de crescimento. O que fazer para lidar com a angústia e o medo do fracasso, talvez, seja perguntar-se: Fracasso para quem? Sucesso para quem? Para um modelo já pronto, talvez nos consideremos sempre fracassados em algo, sempre faltantes. E se já é um modelo pronto, está longe de ter algo a ver com qualquer subjetividade”, salienta Thamires Costa.

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