Crise faz prefeitos não quererem reeleição

Em meio ao arrocho nas contas públicas e com repasses cada vez mais escassos, um em cada dez prefeitos no Brasil desistiu de dar continuidade aos projetos políticos, ficando de fora da disputa em outubro. Nas eleições deste ano, quando 4.258 dos 5.568 prefeitos estão aptos à reeleição, a expectativa é de um índice alto de desistência. “Pelas conversas com os prefeitos, esse número será crescente”, diz Paulo Ziulkoski, da Confederação Nacional dos Municípios.
A dificuldade financeira das prefeituras, a possibilidade de punições nos Tribunais de Contas e a dificuldade em arrecadar fundos para a campanha estão entre os principais motivos das desistências. A mudança de planos também evidencia uma alteração de comportamento e uma preocupação com o ônus do cargo, dizem cientistas políticos.
Até pouco tempo, os políticos se digladiavam para ficar na cadeira de mandatário máximo de suas cidades. Hoje, há uma preocupação em encerrar o mandato sem deixar pendências ao seu sucessor.
Conforme informações levantadas pelo O Expresso, na região sudoeste a preocupação mais recorrente e repetida quase que à exaustão pelos prefeitos é com o pagamento da folha dos servidores municipais. E o receio é justificado. Entre os gestores, o temor é ter de repetir remédios amargos adotados no passado como demissão em massa e atraso em pagamentos, principalmente em 2017.
Para manter o pagamento em dia, alguns prefeitos muitas vezes deixaram de investir em outras áreas importantes e, até mesmo, de pagar em dia os prestadores de serviços.

A temida lei
O receio e a hesitação de muitos prefeitos em não querer concorrer estão ancorados em um conjunto de fatores que vai desde o cumprimento da Lei de Responsabilidade ao financiamento de campanha.
O caso da presidente afastada Dilma Rousseff (PT) é um bom exemplo. O processo que corre contra ela de impeachment é justamente por indícios de práticas de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal.
“A questão da Lei de Responsabilidade Fiscal está como pano de fundo nesse tabuleiro. Por isso, se justifica o receio de muitos prefeitos, já que a lei está assentada em uma questão moral e que traz implicações diretas ao político. A não observação da lei implica em apontamentos do TCE e isso cai, literalmente, na conta do gestor”, afirma o prefeito reeleito de Capão Bonito e ex-presidente do Consórcio de Desenvolvimento da Região Sudoeste, Julio Fernando.
Julio Fernando também ouviu nos últimos dias muitos colegas explicando o porquê de não quererem mais continuar à frente do Executivo.
A instabilidade em torno de alianças visando o pleito de outubro, já que muitos arranjos nacionais poderão não se concretizar localmente e vice-versa, também coopera para inibir os planos de reeleição.
Para o prefeito Julio Fernando, ainda toca em tema de interesse dos prefeitos, rever o pacto federativo.
“A partilha é desigual. O novo governo do presidente em exercício terá de fazer uma gestão de coalizão. E isso passa por uma partilha que beneficie mais as prefeituras”, destaca Julio Fernando, que tem uma das melhores avaliações do Estado.

Situação na região
Um levantamento realizado pelo O Expresso na região sudoeste aponta para seis prefeitos que não optaram pelo projeto de reeleição. Na cidade de Apiaí o prefeito Ari Kinor, mesmo diante dos inúmeros problemas herdados e agravados pela crise econômica, até que teve uma avaliação positiva de governo, mas preferiu não se candidatar à reeleição.
“Dei a minha contribuição e procurei fazer sempre o melhor. Como cidadão espero que o próximo gestor dê continuidade ao trabalho”, afirmou Kinor.
Em Buri, a prefeita Renata Arato concluiu o mandato do ex-prefeito Ú Fonseca e também vinha recebendo uma avaliação positiva e os aliados esperavam que ela se candidatasse à reeleição, mas a prefeita decidiu não continuar alegando que também procurou fazer o melhor possível por Buri.
Sem Renata Arato disputando o pleito, três candidatos concorrem ao Executivo de Buri.
Na cidade de Campina do Monte Alegre, o prefeito Carlos Eduardo Ribeiro também aumentou a estatística dos que não querem reeleição.
Carlos Eduardo assumiu o governo somente no final de 2013, quase um ano após sua eleição, depois de superar um processo.
Enfrentou problemas como greve dos servidores e outros desafios administrativos, mas também optou por dar um tempo na vida pública.
Em Ribeirão Grande, o prefeito Joaquim Brasílio, também não concorrerá à reeleição. Enfrentando muitos problemas nos últimos anos, principalmente com a queda de arrecadação, fechamento da fábrica de cimento, Joaquim Brasílio, preferiu interromper o projeto político.
Mas a grande surpresa na região é a não candidatura à reeleição do prefeito de Itapeva, Roberto Comeron.
Comeron explicou que devido a situação atual, ele como prefeito tem que estar pensando exclusivamente na administração do município. “Neste ano de 2016, tive que tomar severas medidas para equilibrar as contas do município, como a redução de 16 para 10 secretarias, exoneração de diversos cargos de livre nomeação, redução da jornada de trabalho, entre outras. Então, após reunião com meu grupo político decidi focar 100% do meu tempo para administrar a prefeitura de Itapeva, entendendo que, neste difícil momento que estamos enfrentando, não é possível conciliar o meu trabalho de prefeito com a campanha eleitoral”, justificou.
O prefeito falou que pretende entregar o município para o próximo prefeito com as contas em dia, o que segundo ele, não ocorreu quando iniciou sua gestão em 2013, pois teria encontrado o município em péssima situação financeira.
“Eu prefiro concluir o meu mandato pagando o funcionalismo público em dia e honrando os compromissos com todos os fornecedores da prefeitura. Quero entregar ao meu sucessor a prefeitura de Itapeva com todas as contas em dia e com a certeza de ter cumprido a minha obrigação como gestor público”, finalizou o prefeito.
A situação do país e o ônus do cargo também afetaram até as eleições na maior cidade e PIB da região – Sorocaba, onde o prefeito Antonio Carlos Pannunzio, também não foi para reeleição.
O grande desgaste sofrido nos últimos anos, com o corte de investimento em praticamente todos os setores, greves, crise no lixo e outros problemas, minaram a avaliação do governo Pannunzio e dificultaram um projeto de reeleição.
O guapiarense e secretário de Governo João Leandro será o candidato da situação em Sorocaba.

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