Hamilton Roschel, coordenador do grupo de pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrição da Escola de Educação Física e Esporte e da Faculdade de Medicina da USP
Não é exatamente uma novidade dizer que a população brasileira e mundial está envelhecendo. Ainda assim, vale visitarmos alguns números para termos uma melhor ideia da magnitude e velocidade dessa mudança no perfil populacional. No Brasil, por exemplo, quando meus pais nasceram, típicos baby-boomers filhos do pós-guerra, os idosos compunham aproximadamente 3% dos brasileiros. Em 2050, considerando que terei a sorte de chegar até lá, serei um dos mais de 30% de idosos em nosso país, o dobro do número atual, note-se.
Mas não é só a população idosa que aumenta vertiginosamente. Nas últimas décadas, as ciências médicas e a tecnologia foram responsáveis pela ampliação significativa na expectativa de vida, aumentando o tempo em que passamos velhos. Se a expectativa média de vida quando meus pais nasceram ficava ao redor dos 45 anos, atualmente ela é cerca de 30 anos maior, segundo o IBGE. Contudo, se por um lado o aumento do lifespan está “dado”, o healthspan, ou o tempo de vida que passamos saudáveis, não apresenta exatamente o mesmo crescimento. Resultados obtidos em 2015-2016 pelo Elsi-Brasil, Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros, conduzido e coordenado pela Fiocruz e Universidade Federal de Minas Gerais, indicaram que quase 70% dos mais de oito mil brasileiros com 50 anos ou mais avaliados pelo estudo apresentavam pelo menos duas morbidades. Os números sobre a prevalência de incapacidade em desempenhar atividades da vida diária são igualmente alarmantes. Dados do IBGE, de 2008, indicam que aproximadamente 36% dos brasileiros com pelo menos 50 anos apresentavam limitações para execução de duas ou mais atividades da vida diária, o que não só compromete a qualidade de vida, mas também predispõe esses indivíduos a maior chance de mortalidade. Um estilo de vida saudável, com boa alimentação e níveis adequados de atividade física, cumpre a função de propiciar um envelhecimento saudável, prevenindo o desenvolvimento de doenças crônicas como o diabetes, hipertensão, Alzheimer, entre tantas outras. Embora reúna todos os predicados para ser ponto central de atenção no sistema público, o acesso a ações de saúde que incluam abordagens terapêuticas envolvendo exercícios e adequações nutricionais (também) sofre da enorme desigualdade social em meio à qual o Brasil envelhece. Cerca de 90% do idosos do País dependem exclusivamente dos recursos de suas aposentadorias pelo INSS, enquanto 75% deles contam com o sobrecarregado SUS como única fonte de acesso à saúde.
Soma-se a todas essas dificuldades a escassez de infraestrutura e equipamentos públicos destinados à prática de atividades físicas. Não à toa, o resultado de uma vida de desigualdades é uma velhice também desigual, e que é ainda mais agravada ao levarmos em conta gênero, raça etc. Precisamos, pois, pensar em mudança de rota para nossas políticas públicas, de tal forma que estas nos garantam uma velhice mais saudável.
Parece, então, que apesar de termos encontrado uma boa forma de adicionar dias às nossas vidas, ainda temos uma batalha bastante árdua para travarmos em busca do que parecer ser ideal: adicionar mais vida aos nossos dias.