O “Outubro Rosa”, a mulher e a somatização

Walter Martins de Oliveira, Psicanalista e Doutor em Educação

 

A história do movimento, internacionalmente conhecido como “Outubro Rosa”, simboliza a luta contra o câncer de mama. No início da década de 90, do século XX, algumas cidades estadunidenses concentraram no mês de outubro ações voltadas à prevenção do câncer de mama. O principal objetivo se refere à prevenção e ao diagnóstico precoce da doença. Historicamente, o laço sempre teve representação simbólica significativa nas mais diversas campanhas realizadas pelo povo estadunidense. No caso em pauta, membros da fundação do câncer de mama daquele país, após cuidadosa discussão, introduziram a partir de 1992, o laço cor-de-rosa como símbolo internacional para a luta contra câncer de mama. Para além do laço cor-de-rosa, outras ações criativas também surgiram, tais como: ação de iluminar de rosa monumentos, prédios públicos, pontes, teatros etc. No Brasil, a campanha vem ganhando força desde outubro de 2008, seguindo o mesmo método, ou seja, chamar a atenção de todas e todos, envolvendo o uso de iluminação associada ao “Outubro Rosa”, o que se pode perceber em muitas cidades brasileiras a mesma iniciativa de iluminar de rosa monumentos, prédios públicos, estátuas etc. O referido câncer é o tipo de tumor mais frequente em mulheres em todo o mundo. A campanha “Outubro Rosa” tem demonstrado grande sucesso no mundo e no Brasil também, e aqui isto se pode conferir graças aos dados compartilhados pelo Ministério da Saúde, informando o aumento em 37% do número de mamografias realizadas no país. Além disso, nesse período ocorre um maior compartilhamento de informações, corroborando maior conscientização sobre a importância do controle da doença. Detectado precocemente, as possibilidades de cura são de até 95%. As teorias psicanalíticas não sugerem que o câncer de mama, especificamente, seja resultado de uma somatização. O câncer de mama, por ser uma doença de difícil compreensão, tem seu aparecimento em diversos fatores de risco, a saber: genéticos, hereditários (nem tudo o que é genético é hereditário, mas tudo o que é hereditário é genético), hormonais comportamentais e ambientais. A palavra sôma, em grego, significa “corpo”. Para a Psicanálise, a somatização, como modo de enfrentar angústias, ansiedades e desequilíbrios emocionais, é a materialização de conflitos psíquicos inconscientes por meio de sintomas físicos (doenças), sem uma explicação médica plausível. Para Freud (1926/1986), um sintoma somático anuncia, concretamente, a corporificação de um curso patológico. Isto ocorre quando o indivíduo é incapaz de elaborar mentalmente suas situações de estresse. Por exemplo: emoções, tais como: angústia, ansiedade, aflição, culpa, decepção, pânico, solidão, tristeza etc., não reconhecidas internamente, não verbalizadas e não elaboradas, faz do corpo um “terreno fértil” de expressão do sofrimento psíquico, em vista da luta por uma vida equilibrada. Significa dizer que as questões emocionais ou psíquicas podem se manifestar como dores ou condições que não envolvem uma causa orgânica, biológica e objetiva. No que toca ao câncer de mama, a Psicanálise, por trabalhar questões emocionais e subjetivas, pode contribuir enormemente no que concerne à vivência da doença, à forma como o corpo responde ao tratamento, oferecendo insigths (luz, autoconhecimento), iluminando o processo de compreensão, enfrentamento e superação do adoecimento. Diante do exposto, é necessário entender o ser humano de modo holístico, ou seja, contemplá-lo em todas as suas dimensões, especialmente em seus aspectos físicos, emocionais e sociais. O “Outubro Rosa”, remete-nos objetiva e exclusivamente à questão da mulher. O câncer de mama não pode ser refletido e discutido separadamente do contexto social, uma vez que a sociedade em que vivemos, capitalista e machista, contribui de modo assombroso para as desigualdades de gênero, o que impactam negativamente a saúde da mulher. A sociedade machista, por meio da “coisificação” da mulher, impõe-lhe pressões sociais e culturais, exigindo dela padrões de comportamento e aparência que, claramente, podem contribuir para a somatização e adoecimento. Portanto, a luta contra o câncer de mama não pode ser desvinculada da luta pela libertação da mulher, alertando-se para a importância de políticas públicas e campanhas que promovam o empoderamento feminino, autonomia sobre seu corpo e sua saúde integral. A saúde da mulher, a partir de uma abordagem multidisciplinar e inclusiva, promoverá a saúde feminina e a igualdade de gênero, como condição necessária na construção de uma sociedade mais justa, solidária e saudável.

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