O silêncio que viola o futuro do país

A violência sexual infantil é cercada por medos e omissões. As situações de abuso podem ser caracterizadas pelo chamado “pacto do silêncio” entre o agressor e a vítima, o que propicia a continuidade do crime e sua consequente impunidade.
Dessa forma, mostra-se a necessidade que pais, responsáveis e os profissionais estejam atentos aos sinais de alterações de comportamento das crianças e adolescentes. Esses indícios se mostram nas mudanças de humor, ou nas agressões que muitas vezes são ocultadas pelas vítimas.
A curto e a longo prazo, o abuso sexual causa consequências irreversíveis, com alterações físicas, comportamentais, emocionais, sociais e sexuais. Dificuldades de relacionamento, depressão, baixo autoestima, distúrbios sexuais e, inclusive, tentativas de suicídio. Esses são fatores que podem se desenvolver em jovens que, desde cedo, vivenciam situações de violência.
A questão é tão presente em nossos dias que neste momento a série mais comentada da televisão é a “13 Reasons Why”, na tradução em português, “Os 13 Porquês”, que tem como roteiro uma adolescente que planeja de forma detalhada os motivos do seu suicídio. A história é contada a partir de treze fitas cassete que ela deixa para pessoas consideradas cruciais em sua decisão de abandonar a vida.
O machismo e o estupro são um dos principais tipos de abusos sofridos pela protagonista Hanna Baker.
Apesar de haver várias polêmicas entorno da ficção, o drama mostra como a cultura do estupro e o bullying estão presentes no cotidiano destes jovens em todo o mundo. O que talvez não chame a atenção dos telespectadores é que todo o sofrimento não foi compartilhado em nenhum momento com os pais e o silêncio foi a sua principal causa de morte.
Outra forma de violência é a exploração sexual, que acarreta na remuneração à criança, ao adolescente ou às outras pessoas envolvidas no crime. Neste sentido, meninos e meninas são tratados como objeto sexual e mercadoria, o que pode ocasionar gestação e abortos inseguros seguidos de morte. Suas vidas, seus sonhos e seus futuros são roubados.
Em 2016, o Estado de São Paulo recebeu 2.300 denúncias de violência sexual infantil, de acordo com o Disque 100 de Direitos Humanos do Governo Federal. Só na capital, foram 713 casos. Como cada denúncia pode conter mais de uma violação de direitos, o número total recebido foi 2.599. A maioria dos casos são de abuso sexual e exploração sexual, que correspondem a 1.897 e 457, respectivamente. No Brasil, foram feitas, no total, 15.708 denúncias relacionadas à violência sexual de crianças e adolescentes no período.
As estatísticas dão uma pequena mostra da gravidade do problema. O receio em denunciar e a grande subnoti-ficação dos casos permitem que abusadores continuem impunes.
Durante o mês de maio, lembrado pelo Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, a Secretaria de Desenvolvimento Social distribuiu mais de 15 mil cartazes por vários serviços públicos, nas redes sociais e diversos estabelecimentos comerciais no Estado de São Paulo para chamar a atenção da população.
As denúncias destes crimes podem ser feitas anonimamente por meio dos telefones gratuitos “Disque 100 ou 181”.
São Paulo atua com afinco por meio do CONDECA (Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente no Estado de São Paulo), como também nos serviços ligados à Proteção Social Especial. Com isso, o Governo apoia projetos de amparo e resgate de crianças e adolescentes vítimas das mais nefastas formas de abuso sexual. Um deles é o serviço de “Prevenção, Capacitação nas Situações de Violência e Abuso Sexual de Crianças e Adolescentes”, do Instituto Sedes Sapien-tiae, que viabiliza a implantação de polos de prevenção ao abuso de crianças e adolescentes.
Com a proposta de atingir diretamente 2.050 pessoas, o programa capacita profissionais para identificar o problema e fazer o encaminhamento adequado.
As ações visam sensibilizar e mobilizar crianças, adolescentes, pais e responsáveis para que sejam agentes multiplicadores de informações. Esses espaços incentivam a criação e a participação de debates para ampliar o conhecimento dos temas relacionados à cidadania e direitos desses jovens.
É necessário dar às nossas crianças e adolescentes o direito de brincar, crescer de forma saudável, se desenvolver e conviver com sua família e comunidade.
Aos que sofreram com abuso e exploração sexual, vamos devolver a vida, os sonhos, os estudos e o futuro. Às demais crianças e adolescentes, devemos educá-las e agir de modo a combater estes problemas.
Quanto mais conversarmos com nossos filhos diminuiremos os riscos e o sofrimento de ameaças e humilhações.
Todos os anos o futuro do país tem sido violado pelo silêncio de meninos e meninas. Somente uma sociedade comprometida poderá garantir a proteção de crianças e adolescentes para a garantia de uma vida digna e feliz.

Floriano Pesaro, secretário de Estado de Desenvolvimento Social de São Paulo

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