No Parque Estadual Intervales a missão é capturar e colocar um colar com GPS no maior número possível de onças-pintadas
Uma selva exuberante, repleta de tesouros naturais, mas que engana nossos olhos. A Mata Atlântica esconde, na verdade, um cenário desolador.
A imensidão verde, a perder de vista, é uma das maiores áreas de floresta que sobraram da Mata Atlântica.
Os biólogos estimam que restem apenas entre 7% e 12% da cobertura original.
A má notícia é que, mesmo em uma região ainda preservada, é cada vez mais raro encontrar um dos habitantes mais ilustres das florestas brasileiras: a onça-pintada.
A rainha das nossas selvas corre o risco de desaparecer para sempre desse habitat.
Pesquisadores de todo o país unem esforços para mapear e preservar o maior felino das Américas.
No Parque Estadual Inter-vales, em Ribeirão Grande, a missão é capturar e colocar um colar com GPS no maior número possível de onças-pintadas.
“A ideia do rádio-colar é saber exatamente o que uma onça-pintada precisa para sobreviver”, explica Beatriz Beisiegel, bióloga do CENAP/ICM-BIO.
Beatriz se dedica ao estudo dos felinos há mais de 20 anos e conhece o comportamento do animal como poucos.
O trabalho inclusive já foi tema de reportagem do Globo Repórter.
Segundo os biólogos, a operação para instalar as armadilhas na Mata Atlântica é bem complicada. A floresta é densa e montanhosa. Exige esforço físico e muito conhecimento da região.
“O mais difícil é estar escolhendo o local”, conta Gediedson Ribeiro de Araújo, veterinário da Universidade Federal de Viçosa.
O local é estratégico. Além de estar no caminho natural do bicho, é preciso também ser uma área ao alcance do sinal de radiotransmissores. A instalação dos transmissores no alto das árvores é outro desafio.
Com a ajuda de uma engenhoca, Gediedson consegue terminar em poucos minutos uma tarefa que costuma levar mais de meia hora: colocar o transmissor no alto para facilitar o monitoramento dos laços.
Assim que terminam de montar a armadilha, é necessário um teste, para ver se ela vai funcionar normalmente, e eles garantem que a armadilha não machuca o animal. Por isso as pessoas podem até usar as próprias mãos para fazer o teste.
Foi assim, com essa estratégia, que o grupo laçou uma onça-pintada em 2014 no Parque Estadual Carlos Botelho.
A fêmea, batizada de Soneca, tem entre 5 e 6 anos de idade e 54 quilos.
Soneca ganhou um colar com GPS antes de recuperar a consciência.
De volta à natureza, ela está sendo monitorada por satélite.
Segundo Beatriz Beisiegel, com o colar a própria onça-pintada indica quais são as áreas importantes para a conservação dela.
Pelo trajeto, Beatriz calcula que Soneca, por exemplo, andou mais de 80 quilômetros em linha reta.
“Se ela precisa andar muito para viver é porque ela tem pouco recurso nessa área. E esse caminho precisa ser protegido, porque são poucas”, ex-plica Beatriz.
Os pesquisadores contam com a ajuda dos experientes funcionários do parque.
Aparecido chegou a passar a noite no alto do morro conhecido como Mirante do Velho.
Lá é o único lugar onde se pode monitorar o sinal enviado pelos radiotransmissores das armadilhas.
Aparecido vem de uma família que vivia da caça.
“A gente achava que a onça tinha que matar, palmito tinha que cortar mesmo para sobreviver, mas não é bem isso, não”, diz Aparecido Dias de Oliveira, voluntário do Projeto Onças do Vale do Ribeira.
Hoje ele se orgulha em ajudar na preservação do meio ambiente.
Segundo os biólogos, os animais estão sumindo da mata devido o grave problema ambiental chamado defaunação. Mas tem um significado dramático.
“Defaunação é a ausência de fauna. É quando você entra nessa floresta, tem ecossistema natural, mas não tem fauna”, explica Mauro Galetti, biólogo da UNESP.
Na região entre Capão Bonito, São Miguel Arcanjo e Ribeirão Grande existem cada vez menos bichos, pois eles estão ficando cada vez mais raros e preservar tanto a mata quanto os bichos é muito importante.
A estimativa é que existem no máximo 250 onças. E só 50 estariam em idade reprodutiva.
“Se a gente não tomar medidas de conservação desse animal, a Mata Atlântica vai ser o primeiro bioma tropical em todo mundo a perder o seu predador de topo”, lamenta Mauro Galetti.
“É importante a gente lembrar que a Mata Atlântica é um bioma permeado pela ocupação humana. Se a gente quer amanhã um ar de qualidade e uma água de qualidade como a gente tem hoje, essas áreas são de extrema importância”, diz o gestor do Parque Estadual Intervales, Thiago Borges Conforti.